A Responsabilidade do Exemplo

A agricultura Urbana sempre existiu nas cidades e foi-se modelando às mesmas e ao seu desenvolvimento, reflectindo as políticas locais e as mentalidades das pessoas. Desta forma capacitou-se a dar resposta a vários níveis de necessidades e problemas urbanos. Podemos distinguir claramente três níveis distintos: primeiro pode servir como a base de segurança e subsitência de centros urbanos mais pobres e desfavorecidos (muitas vezes vítimas de crises económicas, políticas e de guerras ou de desastres naturais como um terramoto ou cheias devastadoras da malha e estruturas urbanas), num nível intermédio providencia às cidades e meios urbanos “o acesso directo  a consumidores e mercados, disponibilização de recursos baixo-custo tais como resíduos urbanos orgânicos e águas residuais, proximidade de instituições que fornecem informação sobre os mercados, formação técnica e novos desafios urbanos” (Veenhuizen, René van, Cities Farming for the Future Urban Agriculture for Green and Productive Cities, International Institute of Rural Reconstruction and ETC Urban Agriculture , Philippines 2006). Num terceiro nível a agricultura urbana passa a representar mais do que um mero recurso de sobrevivência ou uma necessidade de mercados, passando a representar “a resposta directa dos agricultores urbanos a políticas e programas urbanos, estimulando e permitindo que a agricultura urbana cumpra determinadas funções necessárias para o desenvolvimento sustentável da cidade”. (Veenhuizen, René van, Cities Farming for the Future Urban Agriculture for Green and Productive Cities, International Institute of Rural Reconstruction and ETC Urban Agriculture , Philippines 2006).

Ou seja, a agricultura urbana desenvolve-se ao ritmo das cidades que a acolhem e no fundo reflecte também o se grau de desenvolvimento, e as políticas adoptadas podem focar um nível primário social, secundário ou económico ou terceário ou ecológico. Em Lisboa, tora-se assim urgente adoptar uma posição de terceiro nível face a este fenómeno,como centro urbano cosmopolita  e capital Europeia que é. Não nos podemos limitar a dizer que nInguém subsistirá apenas destas hortas, pois já não é disso que se trata, neste momento os cidadãos lisboetas já devem ser educados para um respeito às hortas hurbanas enquanto centros de desenvolvimento social e reforço da estrutura comunitária, no sentido de posicionar a cidade num lugar exemplar relativamente à matéria em questão.  É da maior importância que os lisboetas deixem de encarar as hortas urbanas como um sinal do terceiro mundo, de pobreza e ruralidade e percebam que estas são hoje um sinal de inovação e posicionamento sustentável a nível mundial de grande importância. A agricultura urbana tem assim, dentro de uma cidade muitas funções e é tanto mais complexa quanto for a cidade em que se insere, é isto que a define, é esta pluralidade de funções e a perfeita gestão e harmonia entre elas, entre aquelas que têm um valor em termos financeiro e as que têm um valor sentimental ou estético. “Novas formas de governo, instituições e políticas precisam de ser trabalhadas através de processos que buscam sinergias e envolvem múltiplos intervenientes.” (Veenhuizen, René van, Cities Farming for the Future Urban Agriculture for Green and Productive Cities, International Institute of Rural Reconstruction and ETC Urban Agriculture , Philippines 2006). A agricultura urbana nã pode ser tolerada, tem de ser  entendida.

Ou seja, é do competo dos orgãos do governo de Lisboa adoptar políticas ecológicas e promotoras desta agricultura multi funcional, no sentido de um desenvolvimento sustentável, sendo que uma das medidas a tomar, nestes casos e segundo  a RUAF é  “apoiar a criação e o fortalecimento de organizações de agricultores urbanos”  (Veenhuizen, René van, Cities Farming for the Future Urban Agriculture for Green and Productive Cities, International Institute of Rural Reconstruction and ETC Urban Agriculture , Philippines 2006)

Observando o actual programa eleitoral do Dr. António Costa, presidente da Câmara de Lisboa podemos ler que “Não queremos uma cidade, igual a tantas outras, obcecada com a criação de mais-valias e, consequentemente, sujeita a grande pressão urbanística e especulação. Pelo contrário, queremos conforto, segurança e solidariedade. Queremos reconstruir e valorizar o espírito de bairro, estimular o “sentimento de pertença” entre os cidadãos e o seu bairro.” (…) Num período de crise económica e social que atravessamos a cidade do futuro tem de ser construída com o esforço e a participação de todos. A crise é uma oportunidade para reequacionar os valores da comunidade em que nos inserimos e assim preparar o futuro em conjunto. Sabemos que os problemas não se resolvem apenas a partir da Câmara Municipal.

A mobilização dos habitantes, em cada bairro e freguesia, e dos que querem investir na modernização da cidade, é fundamental para superar os constrangimentos financeiros que a crise implica. Mas é também uma oportunidade para o exercício de novas formas de cidadania, de solidariedade militante e responsável, de promoção da criatividade e da inovação.” (Unir Lisboa, Actual Programa Eleitoral de Antonio Costa).

Perante estas promessas e crenças, a Câmara de Lisboa assumiu um compromisso que deve honrar e não deixar cair em meras falácias eleitorais.


Horta do Monte Projecto Comunitário

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As hortas em meio urbano são uma realidade em muitos países do Mundo, nas vertentes comunitária, de lazer ou de suporte ao rendimento familiar. A sua presença embeleza os bairros que as acolhem e ajuda a criar um espírito de amizade nos que regularmente se encontram para cultivar os frutos da terra, estimulando uma partilha de saberes. 

Após uma reflexão sobre a importância das hortas urbanas no planeamento urbano e o carácter que a noção de comunidade tem para a prosperidade de uma nação, vou agora falar do projecto da Horta do Monte. Esta é uma horta comunitária existente no bairro da Graça em Lisboa, sendo um exemplo não só ao nível do envolvimento que trouxe aos habitantes da Graça (voltou a colocar muita gente em contacto, trouxe reformados e idosos para um espaço comum), mas também ao nível da acção social que acabou por desencadear, melhorando a frequência do quarteirão onde se encontra e diminuindo a criminalidade da zona e ai da ao nível da lição de cidadania e civismo que dá, ao recolher e tratar do lixo orgânico que é deixado num contentor prórpio da horta, ou apanhado pelas ruas junto da mesma. Além disso esta horta utiliza a permacultura “que é um sistema de planificação e criação de habitats humanos em harmonia com a Natureza. (…) As técnicas da permacultura surgem como formas naturais de se viver dentro de limites ecológicos, permitindo um reencontro entre a cultura e a natureza. Os sistemas permaculturais são globalmente reconhecidos como muito positivos para a cultura, economia e, acima de tudo, ambiente e dignidade humana, pois estes baseiam-se em três princípios: cuidar da Terra; cuidar das Pessoas; distribuir os excedentes e aplicar limites ao consumo.” (Projecto ECOCIDADANIA – Cidadania Ecológica, Passos Simples para a Sustentabilidade,Solidários – Fundação para o Desenvolvimento Cooperativo e Comunitário). Pratica também a compostável e a construção sustentável.

 

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A Horta do Monte é um projecto comunitário que visa promover estilos de vida mais saudáveis e sustentáveis nas cidades, através da prática de cultivo orgânico segundo os princípios da Permacultura, criar e fortalecer laços entre as pessoas das mais diversas faixas etárias, onde a partilha e a transmissão de conhecimentos aconteça. 

As valências desta horta comunitária são muitas e variadas, com benefícios tanto em termos ecológicos como sociais. O aumento do sentimento de pertença a uma comunidade, das relações de vizinhança e de conexão com a natureza são alguns dos efeitos sentidos por aqueles que cultivam os seus vegetais ou flores. De uma forma um pouco mais sistematizada, a horta do monte contribuiu até agora para:

– melhoria da qualidade de vida;

– desenvolvimento das relações de vizinhança e de comunidade, estimulando a interacção social;

– aumento do sentimento de auto-estima;

– embelezamento do bairro;

– produção de comida nutritiva e redução das despesas familiares com alimentos frescos;

– criação de oportunidades para recreação, lazer, exercício físico, terapia e educação;

– aumento das oportunidades para inter-relacionamento entre gerações, idosos e crianças;

– criação de habitats para espécies animais e vegetais;

– funciona como regulador da ilha de calor urbano;

– ajuda na regulação do ciclo hidrológico e na prevenção de cheias, ao ser local de infiltração de águas;

– diminuição da quantidade de lixo, ao reaproveitar resíduos alimentares domésticos para composto.

 

Declaração Universal dos Direitos do Homem

Artigo 23º

” Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana e completada se possível com todos os outros meios de protecção social. “

Zakir, 10, faz uma pausa durante o seu trabalho a cortar peixe na Doca Pesca de Karachi, Fev. 1, 2012. Zakir recebe $2.20 por dia. O umento dos preços da comida e do combustível e a economia em crise, obrigram muitas famílias a enviar os filhos para o trabalho em vez da escola.

Artigo 24º

” Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres e especialmente a uma limitação razoável da duração do trabalho e a férias periódicas pagas. “

A Reuters descreve: ” As lágrimas desenham linhas de sujidade na sua cara, Nabeel Mukhtar um menino paquistanês de seis anos chora enquanto se agacha para lavar melhor uma mota, no seu trabalho de 9 horas diárias, 6 dias por semana, em, Islamabad, Paquistão.

Fair Game???

Hoje em dia assistimos ao surgimento de certificados em muitos dos produtos que consumimos. Surgem certificados de comércio justo, de sustentabilidade ambiental, de artigo amigo do ambiente, etc. Mas a verdadeira questão prende-se em conseguir definir até que ponto estes certificados não passam de uma estratégia de marketing que use uma mera falácia emotiva que jogue com a consciência do consumidor numa altura em que, mais do que nunca, este é bombardeado com mensagens de solidariedade e de necessidade de se preocupar com o próximo.

Ben n Jerry’s uma cadeia de gelatarias com valores baseados na liberdade, paz, amor, sustentabilidade (valores típicos da década de 70), destacou-se recentemente por ter distribuído gelados gratuitos aos manifestantes do movimento Occupy em Dezembro de 2011 no Central Park. Os gelados não tinham quaisquer identificações de marca ou empresa, no entanto os manifestantes acabaram por saber que fora obra da Ben n Jerry’s. As opiniões dividiram-se, mas todos concordavam em desconfiar desta acção pois acreditam que foi uma forma encontrada pela Unilever (multinacional que comprou a Ben n Jerry’s) para se promover e anular atitudes polémicas levantadas por outras marcas que também lhe estão associadas e assim desculpabilizar-se e ganhar a simpatia de um movimento que está a ganhar voz e a atacar as corporações como a Unilever. Além desta acção a Ben n Jerry’s tem promovido a ideia de que utiliza ingredientes fair trade nos seus gelados, mas de novo nos interrogamos “Será que não passa tudo de uma manobra de marketing?”.

“À medida que a civilização e as pessoas evoluem são cada vez maiores e melhores os critérios de exigência por parte de quem usa os produtos e serviços”


Reis, José Luis O Marketing Personalizado e as Tecnologias da Comunicação

Os consumidores são cada vez mais difíceis de satisfazer, daí a grande importância de quem tem a responsabilidade na atribuição de preços, definição de sistemas de promoção e distribuição, estudo dos comportamentos e desejos dos consumidores. Desta forma, a promoção exaustiva do facto dos ingredientes Ben n Jerry’s serem fair trade pode ser vista como um aproveitamento da preocupação do consumidor em contribuir para algo superior a si mesmo, fim de aumentar as vendas e subsquentemente o lucro.

De facto, se analizarmos os LOV’s (list of values) definidos pelo marketing concluímos que há uma sedução, uma mensagem latente, que nunca é dita e por isso mesmo tam tanta força psicológica (compre Ben n Jerry’s):

LOV’s

Natureza interna do indivíduo/ auto respeito, auto satisfação e sensibilidade ( Seja uma pessoa melhor no Mundo de hoje, destaque-se da multidão = compre Ben n Jerry’s fair trade)

Relação com o mundo exterior/ sentimento de posse, respeito e segurança (mostre como se preocupa com os mais desfavorecidos, que tem estatuto e é rico o suficiente para se preocupar e não para que se preocupem consigo = compre Ben n Jerry’s fairtrade)

Orientação interpessoal/ aparentar satisfação, divertimento e ter relações calorosas com os outros ( opte por uma marca cool, por uma marca que defende estes valores = compre Ben n Jerry’s fair trade)

Resta perceber se, ainda que todo este circo não passe de uma jogada de marketing, é algo positivo para o Mundo, é melhor que não fazer nada ou optar por uma marca que não seja tão hipócrita a respeito de querer lucro, mas que não contribui para uma única causa social. E será que o crescimento económico desta marca não benificiará a corporação que a detém e que poderá assim prosperar e continuar a manter outras marcas que lhe pertencem e que se afastam totalmente dos valores da Ben n Jerry’s? Fica a decisão para cada um de nós, porque afinal de contas o objectivo do marketing não é exclarecer o consumidor …

“Only a small part of our responsibility lies in the area of aesthetics” Victor Papanek

 

Tal como Papanek defendia a criação de um produto envolve mais que uma simples criação estética e aparentemente sustentável. Não interessa criar uma garrafa totalmente reciclável, com um rótulo de papel reciclado e com uma forma interessante, se para a fabricar se utilizou o dobro do carbono que será utilizado para a reciclar, e ainda se o seu conteudo não se encontrar de acordo com os princípios utilizados no seu exterior (por exemplo se esta garrafa for o contentor de um sumo que não possua qualquer elemento natural, for maioritariamente produzido com concervantes, produtos químicos e nefastos para a nossa saúde). 

Com base nesta ideia a LemonAid Beverages GmbH criou primeiro o conteudo das suas garrafas e só depois procurou uma linguagem gráfica que se adaptasse aos seus valores sustentáveis. O resultado: uma parceria entre a empresa Alemã e a Blidholm Vagnemark Design (empresa sueca de design, que ganhou grande relevância ultimamente e que se destaca por todos os anos desenhar a garrafa de Mulled Wine, uma bebida natalícia tradicional sueca ), que desenhou as garrafas da Lemon Aid e do Chari Tee que vemos na imagem.

Chari Tee é um chá natural com adição de frutas naturais, é totalmente orgânico e tem a marca fair trade. “The world’s oldest drink is getting trendy again”, diz  Susanna Nygren Barrett a directora creativa da BVD. Lemonaid foi a primeira bebida desenvolvida pela empresa e reflecte os seus princípios sustentáveis: limonada feita em casa e resultante de consecutivas experiências numa cozinha de Hamburgo. O sumo de limão era misturado com diversas quantidades de açúcar e água mineral e dado a provar a amigos, até chegar ao perfeito resultado final. Os produtos usados são 100% fairtrade – limões da pequena cooperativa brasileira Coagrosol (que já conseguiu construir uma escola com computadores de modo a assegurar a educação das gerações futuras) e açúcar de uma cooperativa do Paraguais chamada La Felsina e cujo projecto é construir uma clínica dentária. Além de tudo isto, por cada garrafa vendida, uma percentagem é enviada para suportar projectos sociais nos paises de origem dos ingredientes.

Este é um exemplo em que a responsabilidade vai muito para além da estética, até porque as garrafas usadas têm uma forma simples e clássica com o intento de não parecerem over-designed. O sucesso foi garantido uma vez que são vendidas até em bares elitistas, para serem misturadas com bebidas alcoólicas. Têm também, cada vez mais, vindo a ser referenciadas em sites de trend forecasting como o trend hunter, o que demonstra um interesse social cada vez maior por este assunto e uma mudançao ainda que suave no rumo sociológico ao nível das tendências de mercado.

 

Give to Get it


 

Give to Get it

Dar para receber. Dar o dobro do que estamos habituados para, por fim, entender o verdadeiro valor dos serviços que nos são prestados, dos produtos que compramos, do trabalho por detrás do mercado actual. Dar até parar de sobrevalorizar produtos e subvalorizar quem os produz. Dar de uma forma justa, dar no sentido de dever cívico, na medida em que devemos, enquanto membros daquilo a que chamamos uma Humanidade desenvolvida, pagar justamente por aquilo que consumimos.

Com este blog pretendo reflectir sobre as iniciativas relativas ao comércio justo, esclarecer os leitores sobre as organizações que já trabalham nesta área, divulgar novos projectos e consciencializar o maior número de pessoas para o facto de que tendo em vista o crescimento económico sustentável, devemos, hoje em dia mais do que nunca, valorizar as riquezas e tradições de cada local, desenvolvendo os pequenos mercados que possuem qualidade e trabalhadores com anos de experiência e não procurar mercados descartáveis e emergentes que oferecem um serviço inferior com custos desumanamente reduzidos. Não nos podemos esquecer que, por vezes, os pequenos preços conseguem-se à custa de grandes sacrifícios.

O Comércio Justo (CJ) é um movimento social e económico que pretende construir uma alternativa ao comércio convencional. Ao contrário deste, que tem em conta apenas critérios económicos, o CJ rege-se também por valores éticos que incluem aspectos sociais e ambientais. Significa colocar o comércio, quer de produtos quer de serviços, efectivamente ao serviço das pessoas, buscando o desenvolvimento sustentável das comunidades locais e do mundo como um todo. O que implica, antes de mais, um trabalho digno para todas as pessoas envolvidas e a adequação das actividades económicas às suas necessidades e aos seus interesses.